Justificação da Prática Radiológica: Enquadramento Legal e Tipos de Exposição

O princípio da Justificação, previsto no Decreto-Lei n.º 108/2018, exige que qualquer exposição a radiação ionizante — médica, não médica ou veterinária — só seja realizada se os benefícios superarem claramente os riscos. A legislação distingue três categorias de exposição, com diferentes níveis de exigência e controlo legal, garantindo a segurança de humanos e animais.

técnica de diagnóstico com radiação ionizante

O Enquadramento Legal da Utilização de Radiação Ionizantes

O uso de radiação ionizante em práticas de diagnóstico e terapêutica tem vindo a desempenhar um papel central na medicina. No entanto, a radiação ionizante, ainda que extremamente útil, acarreta riscos para a saúde humana e animal, exigindo uma regulação rigorosa para garantir a sua utilização segura, eficaz e justificada.

Em Portugal, o Decreto-Lei n.º 108/2018, de 3 de dezembro e suas alterações vigentes, transpõe a Diretiva 2013/59/Euratom do Conselho da União Europeia, estabelecendo as normas de proteção contra os perigos resultantes da exposição a radiações ionizantes, introduzindo um enquadramento legal claro para os princípios da Justificação, Otimização e Limitação, pilares fundamentais da proteção radiológica.

O Princípio da Justificação e a Legislação Portuguesa

Entre estes, o princípio da Justificação, previsto no artigo 9.º, assume particular relevância, impondo a necessidade de garantir que nenhuma exposição à radiação ionizante seja realizada sem que os seus benefícios superem claramente os riscos. Para além disso, o artigo 11.º refere-se expressamente à justificação das exposições médicas, sublinhando que cada procedimento médico individual com radiação ionizante deve ser previamente justificado, tendo em conta os benefícios clínicos esperados, os riscos associados à exposição e a existência de técnicas alternativas disponíveis que não envolvam radiação ionizante.

O diploma impõe igualmente que esta justificação deve ser documentada e revista regularmente, especialmente no caso de novas tecnologias ou alterações nos protocolos clínicos.

Dois Níveis de Justificação em Práticas com Radiação Ionizante

A justificação em exposições com radiação ionizante aplica-se em dois níveis distintos:

  1. Justificação Geral da Prática

    corresponde à avaliação global da utilidade de uma determinada prática radiológica. Esta justificação deve ponderar o valor clínico da prática (ex. radiografias, tomografias, radioterapia), o impacto positivo esperado nos cuidados de saúde e a comparação com métodos alternativos (ultrassons, ressonância magnética, endoscopia), com menor ou nenhum risco de exposição à radiação ionizante.

  2. Justificação do Procedimento Específico

    analisa cada exposição individual, tendo em conta o quadro clínico do paciente e o valor diagnóstico ou terapêutico do procedimento radiológico proposto. Esta justificação deve ser feita pelo médico prescritor e confirmada pelo médico radiologista ou operador responsável, com base na evidência científica, protocolos clínicos e diretrizes de boas práticas.

Diferenças entre Exposições Médicas, Não Médicas e Veterinárias

O Decreto-Lei n.º 108/2018, de 03 de dezembro e suas alterações vigentes distingue claramente as categorias de exposição com radiação ionizante, sendo importante compreender as diferenças na justificação da prática em cada uma delas:

  • Exposições Médicas (em humanos):

    • Objetivo: Diagnóstico, tratamento ou rastreio de doenças.

    • Justificação: Deve ser baseada em evidência clínica robusta, considerando sempre alternativas não ionizantes.

    • Envolvidos: Médico prescritor, profissional operador e, muitas vezes, parecer do médico radiologista.

    • Regulação: Apertada, com obrigações de registo e revisão.

  • Exposições Não Médicas (ex. exames ocupacionais, imigração, segurança):

    • Objetivo: Não está diretamente ligado ao estado de saúde do indivíduo.

    • Justificação: Mais restrita e sujeita a parecer prévio da autoridade competente. Apenas permitida em situações legalmente previstas.

    • Regulação: Maior controlo legal, exigindo avaliação ética e científica adicional.

  • Exposições Veterinárias:

    • Objetivo: Diagnóstico ou tratamento de animais.

    • Justificação: Deve seguir o mesmo princípio base das exposições médicas — o benefício para o animal (ou para a sociedade, no caso de zoonoses ou animais de produção) deve superar o risco da exposição.

    • Diferenças relevantes:

      • O consentimento informado não é diretamente aplicável (mas pode envolver os responsáveis legais pelo animal).

      • A exposição de pessoas que auxiliam na contenção dos animais deve ser minimizada e justificada, sendo uma área crítica de fiscalização.

      • Os requisitos de justificação podem ser mais flexíveis, mas continuam sujeitos à regulamentação da APA e orientações específicas para a medicina veterinária, nomeadamente no que respeita ao controlo da dose e da necessidade do exame.

Justificação como Pilar da Segurança Radiológica

A justificação da prática com radiação ionizante é claramente um imperativo legal e ético que garante a proteção de seres humanos e animais contra exposições desnecessárias.

Embora a base científica da justificação seja comum a todas as áreas — humanas, não médicas e veterinárias — as exigências legais e o grau de controlo variam, refletindo a diferente natureza e sensibilidade de cada tipo de exposição.

Promover uma cultura de justificação consciente, informada e rigorosa é, hoje, um fator determinante para a segurança radiológica.

Conclusão

A aplicação do princípio da Justificação é essencial para garantir o uso seguro e ético da radiação ionizante, protegendo tanto pessoas como animais. Para além de um dever legal, trata-se de uma responsabilidade profissional que deve ser integrada nas práticas diárias de todas as entidades envolvidas.

👉 Considere investir em formação e revisão regular dos protocolos, assegurando conformidade com a legislação e reforçando a segurança dos seus procedimentos.


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